Tornou-se, pois, vital organizar expedições que cirandassem por todo o território reivindicado, fazendo levantamentos topográficos, estudando a fauna e a flora e, se possível, estabelecendo pontos de presença permanentes que actuassem como entrepostos comerciais e núcleos de influência sobre o gentio.
Contudo, estas expedições não acarretaram de imediato a fixação de colonos nos matos, tendo-se esta feito com muita lentidão.
No estudo de Vasco Fortuna inserto num livro publicado em 1963 pelo ISCSPU, vemos que no dealbar do século XX, não existiam em Angola dez mil brancos. A população branca cresceu muito lentamente até à década de 50, tendo, a partir de então, havido um forte crescimento. Veja-se o quadro, no início do post, e o gráfico acima.
Em 1960 a distribuição desta população não era uniforme, concentrando-se nas circuns- crições cujas sedes estavam situadas em portos ou sobre os caminhos de ferro. A figura ao lado mostra como 82% da população branca e mestiça se distribuía, nestas condições.
Se alargarmos a faixa até 100 Km de distância de portos ou de linhas de caminho de ferro, obtemos uma percentagem de 94%.
Se representarmos graficamente o número de habitantes fora da faixa em torno dos portos e ao longo dos caminhos de ferro, e representarmos essa população em função da largura da faixa, obtemos o gráfico que a seguir se apresenta, que nos permite concluir que a população “de civilização europeia” estava fortemente concentrada na vizinhança daquelas infraestruturas, rareando no resto do território.
No mesmo trabalho que temos vindo a seguir, o investigador avança, como hipótese de trabalho, a seguinte distinção básica entre os comportamentos da população autóctone e da europeia, que passo a transcrever:
“- A população de civilização africana tradicional procura adaptar-se ela própria às condições naturais que encontra;
- A população de civilização europeia procura adaptar as condições naturais que encontra às suas próprias conveniências”
Assim, a distribuição da população autóctone está estreitamente relacionada com o meio físico, em particular com a pluviosidade, enquanto que a população europeia se distribui pelo território em estreita relação “com os investimentos, e acompanha principalmente duas formas particulares de investimento: portos e caminhos de ferro”.
Não é, pois, de estranhar que em meados do Século XX, a maioria da população autóctone não tivesse contacto estreito com o colono e que a civilização europeia pouco influenciasse o seu modo de viver.
O estudo acima referido esclarece-nos, por outro lado, por que é que a mão de obra nem sempre estava onde o colono precisava, tendo este que recorrer a contratados (pouco mais livres que os antigos escravos) angariados em paragens por vezes muito distantes. O caso dos contratados bailundos, do centro de Angola, para as roças de café centenas de quilómetros ao norte é disto um exemplo paradigmático, como o é o dos contratados bakongos exportados para S. Tomé.
A contratação de mão de obra para roças distantes, donde o regresso era duvidoso (em particular no caso de S. Tomé, com o oceano pelo meio) esteve na origem de pelo menos duas revoltas de grande amplitude. Em 1902 Mutu ya Kevela liderou os Bailundos numa insurreição que se estendeu a todo o planalto central e só foi dominada por uma força expedicionária comandada por Cabral Moncada, no ano seguinte.
Em 1913 coube a vez a Tulante Buta, no Congo (parte angolana), de se revoltar contra o poder colonial, num movimento que só em 1917 foi considerado dominado. A contratação de mão de obra para S. Tomé cessou completamente, e só viria a ser retomada em pleno Estado Novo.
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