Recebi do Manuel Lopes (foto ao lado, daqueles tempos) dois contos que aqui vou publicar, a começar por este, com o título "O meu 25 de Abril".
"Dia de festa dia dos cravos em Portugal, dia de guerra nas matas dos Dembos em Angola. Foi um dos dias mais perigosos e terríveis da minha comissão militar.
Saímos às 4 da madrugada para a mata, já nascia o dia, coisa linda, só vendo, não há explicação, o que fazíamos todos os dias, para fazermos reconhecimento e protecção à população branca e negra nas roças e sanzalas.
Só o alferes e o furriel sabiam o destino, ao passarmos à ponte do rio Tanda que era feita de troncos de árvores, o rio era estreito mas com muita profundidade e rochoso, ao passarmos a ponte, primeiro passaram as viaturas, depois os soldados a pé. Reparámos que havia alguma coisa estranha por perto, os macacos e as aves andavam muito agitados, mas não ligámos.
Seguimos o nosso destino, em pouco tempo choveu e trovejou tanto que fez-se de noite, os relâmpagos pareciam serpentinas e arco-íris no céu, parou de chover, alguns quilómetros à frente encontramos o rio Tanda com um grande caudal e fortes correntes de água, como sempre, tivemos que esperar que baixasse para passarmos, um condutor tentou meter-se ao rio com o burrinho de mato com alguns curiosos, mas a corrente era forte abalroou-os contra as rochas, só o transmissões perdeu a antena do rádio, passamos horas à espera até que conseguimos passar o rio em segurança, eram nove horas da manhã chegamos aos cafezais que pertenciam à roça Maria Fernanda.
Seguimos o nosso destino, em pouco tempo choveu e trovejou tanto que fez-se de noite, os relâmpagos pareciam serpentinas e arco-íris no céu, parou de chover, alguns quilómetros à frente encontramos o rio Tanda com um grande caudal e fortes correntes de água, como sempre, tivemos que esperar que baixasse para passarmos, um condutor tentou meter-se ao rio com o burrinho de mato com alguns curiosos, mas a corrente era forte abalroou-os contra as rochas, só o transmissões perdeu a antena do rádio, passamos horas à espera até que conseguimos passar o rio em segurança, eram nove horas da manhã chegamos aos cafezais que pertenciam à roça Maria Fernanda.
Começou outra vez a chover parecia um dilúvio, as picadas da roça transformaram-se em rios, o pó em barro escorregadio, a Berliet onde eu ia escorregou e tombou para um precipício, não tivemos tempo para saltar, todos nós pensámos que era o fim, o que nos salvou foi um tronco de árvore que amparou a viatura, esperamos que parasse de chover e que as picadas secassem, o que levou algumas horas.
Seguimos em segurança, chegamos ao portão da roça, encontrámos o senhorio que era um branco muito nosso amigo, nós até levávamos uma encomenda de grades de cerveja para ele, estava muito exaltado nervoso e agressivo, o que não era normal, a pedir para não entrarmos, todos nós imaginámos o que era, avançamos com as viaturas, rebentámos com os portões e partimos em grande velocidade, deixamos o homem a praguejar e a pensar mal da vida dele.
Alguns quilómetros à frente, encontrámos a habitação da roça, andavam todos agitados, os empregados negros mostravam-se cheios de medo o que nunca tinha acontecido, a esposa do senhorio colocou-se à frente das viaturas e mandou-nos sair da roça que não precisavam da nossa protecção, eu fui o porta - voz de todos os meus colegas, dirigi-me à senhora, pedi-lhe que se acalmasse que no dia anterior tinha sido tratada na enfermaria do quartel por mim, que não tinha esse direito porque tinham o hospital civil, eu tinha reparado mais para o ser humano do que para as leis, que se acalmasse se queria continuar a ter o mesmo tratamento, só gritava que não precisava da tropa para nada que saíssemos da roça para fora, eu com muita calma pedi que me desse água para mim e para os meus colegas, ela foi logo buscar um garrafão de cinco litros cheio de água mas exigiu-me vinte escudos, eu com sangue frio, tirei-lhe o garrafão das mãos matei a sede e dei aos meus irmãos tropas brancos e negros, não quis ouvir mais o que a senhora dizia, fui encher o garrafão as vezes que foram precisas, entreguei-lho vazio ela pediu-me o dinheiro, atirei-lhe com o garrafão para junto dos pés.
Os nossos superiores deixaram o aviso que a partir daquele momento acontecesse o que acontecesse não voltávamos a dar-lhe protecção e socorro. Ao passarmos o portão da roça ouvimos gritos de provocação e ameaças, eram os turras que iam no cimo do morro carregados com tudo o que precisavam, da alimentação às munições e medicamentos, tudo que nós tropa fornecíamos às roças, era tudo o que nós tínhamos imaginado.
Passado um mês, estavam o casal desta roça no quartel a pedir socorro e protecção, tinham sido atacados pelo grupo de turras, que se iam abastecer lá, mas como a tropa não tinha deixado material não levaram nada e atacaram, destruíram tudo, as ordens que havia era para eles pedirem protecção aos turras, foram postos fora do quartel.
A nossa marcha continuou com direcção ao Coche, ao atravessarmos uma clareira que ficava entre duas montanhas idênticas às das serras de Aire e Candeeiros, fomos surpreendidos por um grupo de terroristas do M.P.L.A, deram ordem ao nosso alferes, para se dirigir com alguns deles ao cimo da montanha, a onde se encontravam os superiores, o resto do grupo mandou-nos sair das viaturas, e colocarmo-nos sentados no chão sem armas, que tinham ordem para a primeira reacção nossa nos abaterem a todos, eram centenas de armas apontadas a nós, passadas algumas horas, apareceu o nosso alferes muito revoltado, com a notícia que tínhamos que deixar ali todo o material que era para ficar na roça Maria Fernanda, se não que ninguém saia dali com vida, ele deu ordem aos turras para levarem tudo e que nos deixassem irem embora em paz.
As horas que tivemos no terreiro à espera do alferes, fomos informados pelo chefe do grupo terrorista, que nos disse que nos andavam a perseguir desde que saímos do quartel, que tinham ordens de nos abaterem ao passarmos a ponte do rio Tanda, mas que não o fizeram porque no momento exacto receberam uma ordem contrária via rádio, que o enfermeiro que estava naquele grupo andava a tratar e muito bem o paludismo ao enfermeiro deles sem sabe, que lhe oferecia muitos medicamentos, que ele levava para o grupo para a mata, se continuasse assim que os grupos que ele acompanhasse nunca iriam ser atacados, naquele momento viemos a saber que agitação era aquela no cafezal junto à ponte.
Partimos dali sem medo, de regresso ao quartel, o dia já se despedia, de vez em quando caíam trombas de água, mas não metiam medo, ficávamos molhados mas logo ficávamos secos, ao chegarmos a uma sanzala a alguns quilómetros de Quibaxe, desabou um temporal que nunca tinha acontecido coisa igual, chuva, trovoada, relâmpagos, e vento forte que levava as telhas de zinco das sanzalas no ar, ouvia-mos a zunir, e nós escondidos atrás das viaturas para não sermos retalhados por elas, o que aconteciam a árvores de grande porte, as chapas eram levadas pelo vento para muito longe, quilómetros e quilómetros, fomos obrigados a esperar algumas horas.
Enquanto esperavamos, o Silva, um tropa e colega negro que era natural daquela sanzala, pediu aos superiores para ir a casa dos pais buscar um rádio, para irmos ouvindo musica enquanto esperávamos que a picada ficasse em condições de partir, deram-lhe ordem, já vínhamos a chegar à entrada de Quibaxe quando colocou o rádio em alta voz, no programa da rádio turra com sede em Brazzaville, para ouvirmos a notícia que tinha havido uma revolução no puto, no continente, a onde o locutor pedia cuidado, que tinha sido uma revolução orientada pelo assassino Spínola, nós não ligamos, porque notícias como aquelas, ou piores, eles transmitiam todos os dias só para nos aterrorizarem, chegamos ao quartel não se ouvia nada a respeito a revoluções, só passados três dias, o nosso comandante reuniu a companhia e transmitiu o acontecimento, a seguir ao dia vinte e cinco de Abril é que foi sofrer deixou de haver guerra na mata para haver guerrilha nas aldeias, vilas e cidades.
Foi assim que passei o meu dia vinte e cinco de Abril de 1974."
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